segunda-feira, 2 de março de 2009

Cai

Cai… Cai de uma altura impressionante. Voava alto, nos sonhos da minha infância, nas entrelinhas da minha imaginação, sentia me inocente, despreocupada… perdida no tempo e no espaço, no turbilhão de desejos pré-concebidos… Cada vez elevava-me mais, cada vez sentia me mais segura daquela criança sonhadora, daquela inocência desprovida. As minhas asas eram grandes, limpas, puras… eram a protecção da minha inocência, eram a minha caixa de sonhos, eram o meu mundo… Um mundo de sonhos, onde bastava um simples toque na vida para ela se transformar… era cobiçada pela minha estranha forma de vida, pela minha inocência e carência de ódio, eu era genuína, um plano concebido a pormenor, bem como todos os meus sonhos e esperanças… a cobiça era geral, para aqueles que não sabiam e não conseguiam sonhar como eu, eu era apenas uma Zé ninguém… alguém que nunca iria chegar longe na vida, o que eles não sabiam é que o sonho é uma constante da vida, que para vivermos de verdade temos de sonhar, idealizar, querer, desejar… no entanto queriam ser como eu, desejavam ser como eu… ter os meus desejos, a minha inocência, saber sonhar como eu, e queriam mais, as minhas asas, a minha protecção, a minha segurança… não as dei, não as vendi, não as troquei… eram minhas, apenas minhas, eram a minha marca, a minha protecção, o meu mundo! Não podia troca-las por nada! Podia ser egoísta, mas estava a sê-lo por algo que era meu, algo que era meu por mérito, se as desse o meu mundo bem como tudo o que tinha construído iria ser destruído por sonhos de ódio e de guerra. Eu não podia permitir isso! Por isso voei, voei alto, mais alto que as nuvens e o céu… voei para alem dos meus sonhos e das minhas esperanças… voei para esconder aquilo que as minhas asas protegiam: a minha mais pura inocência, e o meu amor… guardei-os para lá dos meus sonhos e das minhas expectativas, guardei os onde ninguém jamais poderá alcança-los… quando voltei para trás, para o mundo terreno, as minhas asas vinham enfraquecidas, doridas, sofridas… já não continham amor, eu já não podia amar… a cobiça no ar era como um veneno, que ia intoxicando e matando as minhas asas que aos poucos se iam despedaçando… de tanta dor, cai… e quando acordei já não sentia qualquer calor por dentro… o meu interior estava frio e vazio, as minhas asas caíram… chorando, meti as asas numa caixa, e comecei a vaguear. Pelo caminho todos me olhavam espantados, mas felizes, finalmente eu era uma deles, finalmente eu não podia amar… cheguei perto de um lago, e olhei para o meu reflexo na agua, era triste, melancólico, as minhas lágrimas eram negras como a noite, o meu olhar agoniante… abri a caixa e olhei para as minhas asas que agora estavam ali sem vida… chorando prometi vingar-me… e o ódio que todos sentiam por mim por eu sonhar, transformou-se no ódio que eu comecei a sentir por eles por não amarem nem me deixarem amar…

Hoje guardo as asas bem no fundo da minha alma, no mais profundo canto do meu coração… á espera de um dia eu as ir buscar, e voar de novo em direcção ao amor e sonhos que escondi, com receio da cobiça mos roubar… aí, voltarei de novo a amar, mas ate lá, vou continuar a odiar, para um dia poder vingar todo o sofrimento que senti…

Um comentário:

  1. adorei esta tua discrição sobre a tua tenra infância.... a inocência de sermos crianças é a coisa mais pura que existe no mundo...

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